Parecia que ele tava adivinhando, acordou cedinho, me encheu de beijos, me deu bom dia e foi me amar. Estava mais carinhoso do que de costume, dificultando a minha saída, fazendo quase me arrancar de seus braços para enfrentar um mundo cruel.
Muito cruel por sinal.
Hoje meu pai resolveu me humilhar mais uma vez, como se eu fosse a culpada da nossa situação financeira, como se fosse eu que causasse a despesa, e exigisse o melhor.
Me disse coisas horríveis e fez comparações a psicopatia que ele tem pelo meu irmão mais velho (que culpa tenho se meu irmão não dar bola pra ele?).
Me gritou. Me desafiou.
A culpa não é minha de mais uma vez a energia ter sido cortada, a culpa não é minha da loja não produzir, a culpa não é minha do Centro estar parado e também não é culpa minha do governo ter piorado nossa situação. Eu juro!
Mandou eu dar rumo na minha vida, com tanto que eu não use o caro dele, poxa, quer mesmo que eu seja vendedora de shopping?
Nada contra, mas é tudo que arrumo com a profissão que tenho e sem carro.
Me encontro sem saída, um peso morto dependendo dos outros como se meu respirar pesasse uma de uma tonelada nas costas alheia.
Me arrependo muito das coisas que não fiz, das coisas que deixei pra trás, dos bicos que eu poderia ter feito na noite, mesmo contra a vontade de meu pai, hoje eu teria outra coisa para fazer.
Hoje queria ter alguém pra eu implorar pra querer o meu trabalho, mas não queria ficar aqui nem mais um minuto.
Queria ser forte o suficiente para não chorar, não me abalar, mas é impossível ver tanta acusação onde não tem culpa e tanta falta de compreensão de dor.